O Passageiro



Sou o passageiro, um mero passageiro
que viaja num comboio nocturno de sonhos
que tive ontem à noite. Esperava que
o sono viesse e comecei: o comboio
esperava. A estação estava vazia, dormia
também. Havia uma rapariga que me
queria. E eu queria ela também.
Pensamos em tomar o comboio juntos,
ou apenas um café. Chamei-lhe
mamas ardentes, pois ela tinha
os bicos salientes nuns seios em
fogo. Caiu para o lado à quarta
cerveja. Meti-a na carruagem,
numa liteira precisamente preparada
para o efeito. Bebi éter em
quantidades suficientes para morrer
e adormeci finalmente a seu lado.
Tinha audácia nas pernas longas,
senti-me subir por elas acima
e prever o movimento de rins
subsequente. Também ele ficou
quente. Acordou-a o cheiro,
alguém queimava no quarto ao
lado, e o seu faro de cadela
lembrou-lhe os prazeres do vício
e ela esqueceu os do falo.
Uma mosca, apenas uma mosca,
impediu-a de sair. Tsé-tsé…
Foi uma pena pensou ela, pois
foi pensei eu já roendo o
osso femúrico da sua perna.
Depois tive uma prolepse e já
estava sozinho num comboio
a viajar para o infinito

e às vezes mais além.  

Aerofagia











Aerofagia


Se as palavras

Tivessem o peso devido,

Voavam:

Palavras leve-as o vento.

Se eu apagasse
As palavras que digo,
Deixava de as escrever:
Traição. Três dias. Trivial.

Eu sou a fera assassina
Que, voraz areófago,
Engole o indizível
Enquanto discursa opúsculos.