Na Cidade (excerto, in Sonhando o que te contarei mais tarde)



― Não é motivo suficiente? Tem em conta a época em que isto se passou. Aliás, nem que fosse hoje, seria sempre uma desonra para qualquer família.
― Mas não achas que a devemos tratar como uma pessoa, que ela é, ainda por cima da família? Ninguém merece ser rejeitado pelo que é. Não fez mal a ninguém.
― Lá isso é verdade.
― Mesmo que as pessoas ficassem sentidas, ou mesmo perturbadas com o comportamento dela, não será altura de acontecer um qualquer processo de cura, ou perdão, cicatrização?
― Não sei, meu. Nem quero pensar nisso. Por que é que achas que eu saí daí? Babilónia, mano. Muita confusão. Muito problema. Sabes o que odiava na cidade? Não era o barulho, os carros a apitar, os autocarros que, ao passarem, abanavam o prédio, os bêbedos na rua aos gritos, que não deixavam ninguém dormir. Não era isso. O que eu odiava era o modo como as pessoas não se davam umas com as outras. As discussões. Os preconceitos. A falsa moral. Opressora e hipócrita. A cidade é isso, para mim, mano, e tão cedo não me apanhas a viver aí. Não sei como ainda consegues. Quanto ao resto, não me interessa se a Z. era santa ou puta, empregada doméstica ou drogada. Isso é a vida dela.







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