Avatar (25 razões para ficar em casa a ver a novela)


Não vi o filme, confesso, mas sinto no ar aquela euforia desproporcionada e contagiosa que, como uma gripe A, vai fazendo tombar as opiniões voláteis dos pseudo-cinéfilos-mais-acéfalos-do-que-outra-coisa em direcção à aclamação universal típica de um Titanic. Toda a gente sabe que o Titanic foi o maior mastodonte de sempre, tanto dos mares como das telas, embora o primeiro tenha tido resultados desastrosos. O segundo foi imensamente concorrido, mas eu boicotei-o como sempre se deve fazer em relação às unanimidades. Não as pode haver. I don't want to belong to any club that will accept me as a member, Groucho Marx disse, e eu sempre tentei reger a minha vida segundo este lema, excepto no caso do Clube dos Poetas Mortos, que eu ainda assim acabei por renegar depois de ter visto o filme e perceber que não era sobre poetas suicidas. Mas quando o Titanic saiu, eu dizia, toda a minha turma faltou às aulas para ir assistir a uma matiné, todavia eu mantive-me estoicamente à parte (também boicotei a Expo 98 por essa altura). Razões para tais posicionamentos? Tenho as ilógico-sentimentais, na linha da citação marxiana supra-plasmada, e as lógicas, que por muito pequenas que sejam, adquirem uma dimensão titânica na presença de biliões de ovelhas seguidoras. Ir ver um filme apenas por ser a maior produção de sempre não me parece uma explicação lógica para se gastar dinheiro num bilhete de cinema. As pessoas, na pequenez dos seus cérebros, são atraídas pela grandeza, portanto um pouco de publicidade prepotente e magnânima é bem capaz de atrair a maioria, e toda a gente sabe como é bom fazer parte da maioria! Se os outros gostam, então eu também gostarei, certo? Errado... Visionei o Titanic, anos depois, na televisão, num daqueles domingos à tarde, e nada mais se me apraz a dizer senão que é uma película como as outras, uma historiazinha de amor proibido, para apelar ao coração feminino, e muita sumptuosidade e destruição, para apelar ao espírito animalesco do homem. Claro que se gastaram milhões de milhões de dólares, como nunca antes, mas será que vale a pena fazer isso quando tantas crianças morrem de fome no mundo inteiro? Onde está a nossa consciência? Atrás da nossa necessidade de entretenimento, suponho.

Como o Titanic, o Avatar é publicitado à partida como a produção mais dispendiosa de sempre, o que me fez desde logo desconfiar. E tem o mesmo nome à frente do projecto, James Cameron, double suspicious! Mas tudo isso poderia ser amenizado, de forma a levarem-me a ver tão extraordinário e por vezes inadjectivável filme, se não continuassem a anunciar recorrentemente: "Avatar, o novo filme de James Cameron, o mesmo realizador de Titanic!" Por amor de Deus, o homem fez coisas mais interessantes e apelativas, pelo menos à minha geração, nomeadamente o Alien original, os dois primeiros Extreminadores Implacáveis, e até foi o responsável pelo script do melhor Rambo de sempre, que é o II. Não falo do Abismo, porque isso foi o princípio do fim, ou seja, quando ele começou a querer fazer filmes megalómanos no fundo do mar. Daí ao Titanic foi um passo. Acho que, na verdade, James Cameron sempre quis ser mergulhador, e os filmes vêm por acréscimo, como se a única forma que ele tivesse encontrado para submergir aos mais interessantes pontos sub-aquáticos, e dispor dos melhores submarinos e restante apparatus, fosse fazer filmes sobre isso. O resto foi a máquina de Hollywood a trabalhar, e essa ninguém a pára quando há potencial de blockbuster. Em Avatar não vamos ao fundo do mar, pelo contrário, somos levados a um planeta distante, onde um romance entre um humano e uma extraterrestre acontece em condições adversas, i.e., Alien meets Titanic...

Mas esperem! Há mais a adicionar a este argumento de falta de originalidade do argumento. Lembram-se da Pocahontas? Agora experimentem substituir o guerreiro terrestre (desculpem, mas não sei os nomes deles, nem me dou ao trabalho de ir à wikipédia descobrir), pelo explorador John Smith, a alien giraça pela Pocahontas, que lhe ensina a respeitar a natureza do seu território, e verão que também há um chefe indígena em versão pai-tirano que quer obrigar a casar a sua filha com um bravo guerreiro local. Claro que a "princesinha" e o explorador (que é o verdadeiro alien, neste caso) se apaixonam, apesar de estarem em lados opostos de uma guerra (Romeu & Julieta?) e tudo parece bater certo até final em termos de avanço narrativo (ver mais em http://www.brainstorm9.com.br/wp-content/uploads/2010/01/avatar-pocahontas.gif )

Ah, outra coisa, parece que o filme tem avanços tecnológicos tão fantásticos em termos de tecnologia 3D (o nome oficial do filme é, pasme-se, Avatar: An IMAX 3D Experience!) que li no status do facebook de uma alma menos afortunada quando distribuiram a inteligência algo deste tipo: Wow! Espectacular! Acabei de ver o Avatar no IMAX! a vida real devia ser em 3D!

Mais uma vez, o facto de o filme (er, ou devo dizer "a experiência IMAX") ser em 3D não devia ser argumento suficiente para gastar 15 euros em bilhete, óculos e balde de pipocas XXXXXL que nunca vamos acabar de comer. Faz mal à saúde, já ouvi dizer, e não me refiro às pipocas somente. Por alguma razão que me escapa, os filmes 3D estão a ser classificados para M/18, independentemente do conteúdo. Se eu fosse um adolescente, a coisa que eu mais quereria fazer neste momento era ver a porcaria do Avatar! Mas como não sou, infelizmente, recomendo, na mesma linha temática, o Planeta 51. Gargalhadas garantidas e extraterrestres femininas sexualmente desejáveis (ou não tivesse a Jessica Biel como protagonista vocal).

Avatar: uma experiência de marketing cujos efeitos nefastos incluem a delapidação das poucas economias de um mundo em recessão e a profusão de posts internéticos dignos de 15 minutos de fama no failbook.com!

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